Tornar a previdência complementar mais atrativa e, com isto, melhorar o preparo da população para a aposentadoria tem sido um desafio comum a países de todo o mundo. Mesmo com diferentes características socioeconômicas, as nações que elevam a cobertura previdencial desfrutam de maior capacidade de investimentos de longo prazo, de maior qualidade de vida da população – em especial a idosa – e de menor peso nas contas da assistência social provida pelo Estado.
Neste sentido, o Reino Unido tem se destacado, com a introdução, ano após ano, de políticas inovadoras para incentivo à previdência complementar. A maioria destas mudanças foi introduzida no país através de planejamentos estratégicos bem estruturados, revisados anualmente pelo The Pensions Regulator, órgão governamental responsável pela supervisão do setor. Na última década, algumas das ações mais modificadoras para a previdência complementar britânica foram:
- a introdução da adesão automática a partir do ano de 2012 – que, dentre outros elementos, obrigará todas as empresas a oferecem a seus empregados um canal de acesso à previdência complementar até o ano de 2018;
- paralelamente ao ato anterior, a criação, em 2011, de um plano de benefícios na modalidade Contribuição Definida denominado NEST, gerido pelo governo e acessível a todos empregados e empregadores, e que em menos de três anos de funcionamento já reúne um milhão de pessoas; e
- a apresentação, no último mês de março, de uma série de medidas para flexibilização de regras de aposentadoria, objetivando, principalmente, ampliar as opções dadas às pessoas para acessarem os recursos que acumularam ao longo de seu tempo de serviço. O resumo das mudanças pode ser lido aqui.
Colhendo resultados
Mudar regras normalmente não é tarefa fácil. Quando o assunto envolve o interesse de milhões de pessoas e de milhares de empresas, além das centenas de bilhões de libras esterlinas administradas pelos planos de previdências britânicos, é de se imaginar que os obstáculos sejam bastante consideráveis. Mesmo assim, já há estudos e pesquisas que nos mostram algumas das resultantes obtidas pelo Reino Unido com as reformas introduzidas nesses últimos anos.
Recentemente, a secular provedora de serviços financeiro britânica L&G divulgou os resultados de uma pesquisa que aferiu a reação da população às medidas de flexibilização anunciadas pelo governo do país em março. É revelador o fato de 25% dos entrevistados afirmarem que se sentem incentivados a poupar mais após as medidas divulgadas, mas ainda mais surpreendente é ver este mesmo resultado dentre o subgrupo de pessoas entre 18 e 34 anos: quase metade (44%) indicou o interesse em aumentar sua poupança em decorrência das recentes mudanças.
Qualquer política que consiga atrair, desta forma, a atenção do público jovem é, sem dúvida, uma importante conquista, sob a ótica do fomento.
Também já é possível aquilatar os primeiros resultados do processo de implantação da adesão automática. Em um ano, dois milhões de pessoas se tornaram participantes de planos de previdência através de quatro mil patrocinadores – o que inclui muitas empresas que, até então, não ofereciam a seus empregados o acesso à previdência complementar. Os níveis de não adesão (opt out) aos planos oferecidos está, até então, na casa dos 10% – é apenas um terço dos 30% inicialmente esperados pelo Governo, indicando que a população acolheu bem a novidade.
Peça de divulgação do governo britânico demonstra os resultados iniciais da adesão automática
Enquanto isso, no Brasil
Como dissemos no início deste artigo, é comum a diversos países o desafio de aumentar a poupança previdenciária. No entanto, enquanto algumas boas experiências internacionais são inspiradoras, é preciso cautela para identificar o que é aplicável às características do nosso país.
Neste sentido, vê-se que as lideranças locais têm buscado estudar e propor mudanças. Além dos trabalhos independentes desenvolvidos por organizações representativas do setor, como é o caso da Abrapp, que anualmente dedica parte de seu congresso anual a apresentar e discutir pesquisas e iniciativas ligadas ao fomento, o Governo Federal trabalha com o claro objetivo de ampliar a cobertura previdencial e tem direcionado ações para tal.
De início, é notável o fato de contarmos com uma Secretaria exclusivamente dedicada a propor políticas para a previdência complementar – trata-se da SPPC, vinculada ao Ministério da Previdência Social. Ao final de 2012, partiu dessa Secretaria a iniciativa de realizar um amplo estudo com empresas e entidades de classe para diagnosticar problemas e propor ações para o fomento da previdência complementar.
Fiz parte da equipe da GAMA que desenvolveu o estudo com a SPPC e posso afirmar que há muitas alternativas para alavancarmos o nível atual de cobertura previdencial. E, sem dúvidas, há espaço para crescer. Basta olharmos para algumas estatísticas reveladoras: temos dezenas de milhares de empresas que ainda não oferecem planos de previdência a seus empregados; apenas 3% da população economicamente ativa é participante de um plano – o índice chega perto de 100% em algumas nações desenvolvidas; e a relação entre o volume de poupança administrado pelos fundos de pensão e o nosso PIB é de apenas 15% – em alguns casos, este percentual ultrapassa 100%.
Com a intenção de melhorar essas estatísticas, o CNPC – Conselho Nacional de Previdência Complementar criou, no final do ano passado, a Comissão Temática 2. Sob a coordenação do Secretário-Adjunto da SPPC, José Edson da Cunha Júnior, o grupo pretende apresentar, em breve, ações relacionadas ao fomento. Dentre as propostas, está a criação de um produto a ser oferecido pelos fundos de pensão com características de tributação similares ao VGBL, hoje disponível apenas nas entidades abertas. O governo estuda permitir, também, que parte dos recursos acumulados pelos participantes em seus planos de previdência possam ser sacados mediante a observância de regras específicas – hoje, o resgate é possível apenas com o rompimento do vínculo existente com o patrocinador.
Dentre as boas ideias em discussão, sente-se a ausência, no entanto, de iniciativas que tornem a previdência complementar mais atrativa para as empresas. Afinal, uma das grandes razões da adesão aos fundos de pensão é que, na maior parte dos planos patrocinados, há paridade contributiva. Em outras palavras, a cada real colocado no plano pelo trabalhador, seu patrão realiza uma contribuição adicional de valor equivalente – um rendimento imediato de 100% do capital investido. Por meio do ingresso de novas empresas patrocinadoras, o Brasil poderá ampliar o acesso à previdência complementar e acolher milhões de trabalhadores que hoje estão cobertos unicamente pelo INSS.
Para avançarmos neste e em outros aspectos, é válido buscarmos inspiração nas experiências de outros países, mas é sempre preciso lançar um olhar personalizado às necessidades da população brasileira. Por fim, é necessário ter em mente que a necessidade de fomento é contínua: não será por meio de um conjunto de ações pontuais que atingiremos os resultados que almejamos, e sim mediante estratégias implantadas de forma planejada, constantemente monitoradas através da medição de resultados, e revistas periodicamente, para que estejam sempre atualizadas às mudanças de cenário.